quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Pequena e grande corrupção. 030109

(Publicado no «Jornal de Notícias, 9 de Janeiro de 2003)

Há alguns anos, um cidadão justificava a sua escusa de participar como jurado num julgamento, dizendo que, desde pequeno, lhe doía a cabeça, sempre que pensava.

Felizmente, vou correndo o risco de enfrentar essa causa de sofrimento. Há dias, a propósito de notícias dos órgãos da comunicação social, um grupo de amigos conversava sobre corrupção. Tudo o que ouvi fez-me reflectir e julgo poder concluir que a corrupção existe quando um indivíduo, numa posição de poder (desde o porteiro da autarquia até ao mais alto governante) recebe «atenções» de um cidadão que, no momento ou a prazo poderá vir a usufruir benefícios desse acto «generoso».

Normalmente, distingue-se o corruptor activo (o que deu a «atenção» ao indivíduo no poder) do corruptor passivo (o indivíduo que recebeu a «atenção»). Porém, há excepções, como a publicitada, há poucos anos, nos jornais em que o tribunal condenou dois corruptores activos, sem que viesse a ser acusado o corruptor passivo. Eles corromperam quem?

Os efeitos da corrupção podem ser imediatos ou diferidos, sendo estes mais discretos e considerados um investimento. Imediato, é o acto traduzido, por exemplo, no perdão da multa pelo agente fiscalizador em troca de umas dezenas de euros. Diferido, ou a prazo, é o acto que consiste em o restaurante não cobrar o almoço do agente policial, ou na oferta pelo Natal de um peru, um garrafão de azeite ou de vinho, ou uma garrafa de wisqui, ou a oferta de uma viagem em jacto privado, ou de férias numa ilha tropical, ou o fim de semana num hotel de luxo, etc.

Como não há almoços grátis, as «atenções» do corruptor activo acabarão por ser um investimento rentável, recompensado pelas decisões favoráveis do corruptor passivo.

A corrupção é diferente do marketing. O desconto dos saldos, a agenda ou o calendário, ou a amostra de perfume distribuído pelos potenciais clientes não obrigam este a retribuir o favor, não criam dependência, não restringem a liberdade, não prejudicam qualquer instituição pública.

Enfim, quando se pensa em corrupção não se pode focar a atenção apenas nos agentes policiais, e deve encarar-se os dois aspectos passivo e activo. Pois é! Pensar faz doer a cabeça. No mínimo, dá sensação de angústia.

Sem comentários: