sábado, 15 de agosto de 2009

Alcoolemia e obsessão legislativa. 060411

(Publicada no Diabo em 11 de Abril de 2006)

Já há muito que os cidadãos mais atentos se aperceberam que os políticos padecem da mania obsessiva de que as leis, só por si, resolvem qualquer situação indesejável. É uma fé fundamentalista nas virtualidades da legislação. Quando uma situação se torna demasiado incómoda, fazem uma lei que agrava as penalizações anteriores e... vão dormir descansados por terem cumprido o seu dever. Mas a realidade passa-se num mundo diferente da nuvem celestial em que eles pairam, e tudo continua tal como anteriormente. O caso mais visível é o do Código da Estrada que demonstra que não há senso, nem não tem havido. Agora ameaçam com mais uma descida da taxa de alcoolemia máxima permitida. Mas os argumentos soam a anedóticos. Dizem que a maior parte dos mortos em acidentes que tinham excesso de álcool apresentavam taxas superiores a 1,2gr/l. E isso não é o pior, pois os recordes de Norte a Sul são múltiplos desse valor. Para que tais taxas fossem puníveis bastava que o máximo permitido fosse de 1,0gr/l. Ora ficou provado que o Estado não conseguiu fazer cumprir a taxa de 0,4gr/l. Será que alguém acredita que fará cumprir a taxa de 0,2gr/l? Alguém com senso terá a ousadia de nos convencer de que as altas taxas detectadas desaparecerão? Porquê?

A realidade é que essas taxas encontradas nos mortos e em muitos condutores vivos não ocorreram por falta de lei, mas sim por a falta de civismo não ser compensada por eficaz fiscalização e repressão, policial e criminal, que exerça poder dissuasor e obrigue a respeitar a lei existente. Sem isto, a lei pode ter as maiores restrições que nada resolve, como tem sido demonstrado nas estradas. A decisão governamental devia, por esta lógica, criar condições para operações frequentes e eficazes de inspecção e fiscalização, seguidas de decisões judiciais rápidas e publicitadas. É notório que os acidentes e as vítimas têm sido um pouco menos numerosos desde que as polícias intensificaram a sua actuação, criando dissuasão.

Poderá desta forma concluir-se que a redução da taxa permitida não é necessária nem resulta, por si só, em qualquer eficácia, traduzindo apenas uma tendência sádica dos políticos e mostrando que nem sempre há senso.

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