sábado, 15 de agosto de 2009

Bill Gates e os Portugueses

(Publicada no Jornal de Notícias em 8 de Fevereiro de 2006, p. 40)

A visita de negócios que Bill Gates fez a Portugal suscita reflexões de vários tipos. Por um lado, foi curiosa a avidez manifestada pelos notáveis do País em se mostrarem na TV ao lado de tal génio, talvez inconscientemente convencidos de que as capacidades dele e a sua fortuna actuariam à laia de «doença» contagiosa e se transmitissem por simples contacto epidérmico ou pelo ar respirado. Mas, desiludam-se porque se o saber e a cultura do rigor e da excelência se transmitissem dessa forma, os empregados de brilhantes pensadores tornar-se-iam grandes filósofos, o que não tem sido curial.

Por outro lado, é de realçar que, ao contrário de cantores de duvidosa qualidade que pedem dezenas de toalhas, dúzias de bebidas, toneladas de flores, etc, para os seus aposentos, Bill Gates apenas pedira para o seu quarto uma mesa para trabalho. Quem tem realmente valor, não precisa de ornamentos ostensivos. A sua simplicidade é o segredo do seu êxito. Pensa e age no sistema binário – 1 ou 0 – com a máxima singeleza e transparência. Aquilo que os «intelectuais lusitanos» não conseguem dizer em longos discursos, ele transmite claramente em poucas palavras.

Por outro lado, a formação de um milhão de técnicos em informática, só por si, não vai desenvolver Portugal, da mesma maneira que uma óptima caneta não transforma o seu utilizador num bom escritor, ou uma colecção completa de tintas e pincéis, só por si, não cria um bom pintor. Também a informática não passa de uma ferramenta, extremamente vantajosa para o desenvolvimento de uma actividade económica rentável. Mas é preciso criar essa actividade; é indispensável estimular o «empreendedorismo», a criatividade, a inovação, o culto da excelência (trabalhar com prazer e entusiasmo, procurando rigor e perfeição). Sem o esforço para desenvolver as mentalidades nesse sentido, a informática pouco efeito positivo terá, limitando-se a instrumento de entretenimento para jogos, «chats» e troca de e-mails com anedotas, sem ir além dos efeitos hedonistas. E essa actividade económica, esse trabalho tem de ser feito por nós, não podendo esperar-se que alguém o faça em nossa substituição e o benefício nos caia no bolso. Bill Gates tem repetido bons conselhos aos jovens das escolas que tem visitado pelo mundo. A humildade dele leva a que todos os dias ponha em causa o trabalho da véspera e procure fazer melhor, donde advém o desenvolvimento imparável da sua empresa.

Mas, pelo andar da carruagem, tudo parece fazer prever que os jovens portugueses não estão mentalizados de que o enriquecimento honesto obtém-se com o suor do próprio rosto. Não estão inclinados a seguir os exemplos de Bill Gates nem dos nacionais Belmiro de Azevedo, Nabeiro, Salvador Caetano, irmãos Amorim e outros. E o ensino, que devia ser preparação para a vida, não parece estar orientado para este objectivo nacional do desenvolvimento. Que esperar?

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