(Publicada no Diário de Notícias em 26 de Janeiro de 2006, p. 8)
As eleições presidenciais decorreram normalmente e os resultados não trouxeram nada que destoasse das sondagens. Foi no entanto enfatizado um fenómeno que se vem desenvolvendo há já algum tempo e que suscita a necessidade de os políticos reverem os seus conceitos e comportamentos. A cúpula do PS «decidiu» que os seus eleitores iriam votar no candidato por ela escolhido, mas conseguiu apenas 41 por cento dos votos dos eleitores da sua área. Mas, entretanto, uma figura célebre e fundadora do Partido, resolveu candidatar-se como independente, sem qualquer apoio do Partido e, apesar da hostilidade da sua direcção, conseguiu os outros 59 por cento dos eleitores, evidenciando uma capacidade mobilizadora igual a 1,4 vezes a da direcção do Partido. Isto representa, sem dúvida, um fracasso dum grande Partido Político cuja cúpula vive miopemente centrada no seu umbigo, obcecada com interesses da sua clientela e totalmente alheia aos pensamentos, interesses e emoções dos seus militantes e simpatizantes, os quais não se revêem na direcção, não se querem subordinar às suas decisões e agem pela sua cabeça.
O fenómeno não é novo e já ficou bem visível numa antiga eleição autárquica em Penalva do Castelo («quem está com o Governo come, quem não está cheira») e, recentemente, em Felgueiras. O mesmo aconteceu com o outro grande partido nas recentes eleições autárquicas em Oeiras e Gondomar. Os partidos perderam autoridade.
Como disse Manuel Alegre, a Democracia não pode confinar-se aos partidos e é possível a criação de movimentos cívicos para objectivos específicos quando os eleitores desejam. E isto acontece quando os partidos se transformam em meras máquinas de conquista e manutenção do poder, em benefício de um grupo que actua como um clã, uma corporação ou uma «família», asilando jovens sem qualquer esperança profissional numa actividade séria e produtiva, usando, para isso, toda a espécie de «baixa política», manobras, tricas, propagandas, com vistas curtas, olhando apenas para os interesses pessoais e imediatos, evidenciando ambição desmedida, ostentação e ânsia de mediatização, condimentada com incapacidade e insensatez. Os interesses do Estado são ultrapassados pelo desejo de bom gabinete, carro novo, ordenado e extras, pensão elevada obtida em curto prazo e posterior colocação num tacho ou poleiro cómodo, bem remunerado e com possibilidade de acumular mais pensões de reforma.
Perante um tal cenário, não admira que os partidos percam credibilidade e importância cívica e social como se está vendo. E agora? Perante o caso vertente, qual será o destino da cúpula do Partido? Quem tem mais poder real, a cúpula ou o candidato que evidenciou mais capacidade para mobilizar eleitores? O que reserva o futuro próximo?
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