domingo, 16 de agosto de 2009

Mais vale prevenir do que remediar. 030819

(Publicada em «A Capital», 2003.08.19, pág. 15)

À primeira vista, parece que já demasiadas pessoas emitiram opinião sobre o drama dos fogos florestais. Porém, julgo que não é demais insistir no problema, a fim de que a actual situação emocional não se extinga antes de serem tomadas decisões práticas e exequíveis. Embora hoje as conversas se foquem nos crimes de fogo posto, parece que o objectivo principal deve ser voltado para o futuro, deve versar a adopção de medidas de prevenção que venham a impedir que qualquer fogo, de qualquer origem, se expanda por áreas incontroladas.

Se, com as próximas chuvas, deixar de se falar na reestruturação e manutenção da floresta, certamente que, no próximo ano, arderá tudo aquilo que este ano escapou. Por isso, é absolutamente necessário que não se deixe de falar nisto, alertando os responsáveis para a urgência do problema, o qual não pode deixar-se secundarizar com qualquer caso que entretanto surja.

Permito-me esboçar duas reflexões que julgo significativas. A primeira refere-se à limpeza das matas. Há quem faça comparações com o que sucedia há cinco ou mais décadas. Mas, efectivamente, não há comparação possível. Nessas datas, as matas estavam limpas, por vezes em exagero, porque todo o material delas retirado era útil para a vida das populações rurais e para as tarefas agrícolas. Ninguém tinha como objectivo limpar as matas; estas resultavam limpas por efeito do aproveitamento da «esgalha» dos pinheiros, da roça do mato e da apanha da caruma.

Hoje, para se conseguir ter as matas limpas seria necessária mão-de-obra, que não existe (apesar da taxa de desemprego!), seriam necessárias máquinas que teriam o inconveniente de impedir o crescimento dos pinheiros acabados de nascer. E, depois, qual o destino dos produtos resultantes da limpeza? Se forem deixados em medas, constituem bombas incendiárias. Outra pergunta será: onde irão os pequenos proprietários, muitas vezes idosos, com pensões de miséria, buscar dinheiro para pagarem essas limpezas? Fica, pois, a pergunta de resposta difícil: deve ou não fazer-se a limpeza das matas?

Uma segunda reflexão, que de certo modo responde à primeira, liga-se à compartimentação da floresta por aceiros largos e mantidos perfeitamente limpos, à alternância de faixas de árvores folhosas, com outras de pinheiros e de eucaliptos, com pastagens, e aos acessos fáceis a todos locais, etc.

Estas actividades de reordenamento, nomeadamente a desflorestação dos aceiros, irá prejudicar principalmente os pequenos proprietários. No curto prazo, prejudica interesses privados. Mas trará benefícios no longo prazo, evitando os dramas deste Verão. As pessoas, quando esclarecidas, compreendem isto. As televisões mostraram no Algarve povoações que escaparam aos fogos porque, à última hora, limparam os terrenos à volta e abriram aceiros e clareiras sem olhar aos limites das propriedades, aos jardins aos quintais e aos pomares. Ninguém se opôs, como é lógico. Porém, se alguém lhes tivesse sugerido tais trabalhos, uma ou duas emanas antes, estou certo que ninguém deixaria que as máquinas destruíssem as suas propriedades!!

Há, pois, que esclarecer as pessoas e os responsáveis para se colocarem de acordo na compartimentação da floresta, com as justas indemnizações aos proprietários de pequenos terrenos engolidos pelos aceiros. Isso seria um investimento que evitaria os prejuízos que hoje se conhecem.

Depois de calculados os custos dos prejuízos sofridos com os fogos deste Verão deveria contar-se com mais 20 ou 30 por cento para gastar em trabalhos de prevenção, como atrás ficou referido. Se assim não for, o muito que se poupe e deixe de se gastar na prevenção será, certamente, ultrapassado pelos prejuízos dos fogos que virão a ocorrer. A lição deste Verão não deve ser esquecida. Prevenir é investir para o futuro, é sacrificar os interesses individuais de hoje em benefício dos interesses colectivos de amanhã. Vale mais prevenir do que remediar. Isto não significa, porém, que não se aperfeiçoem as condições, os meios materiais e as pessoas para o combate aos focos de incêndio que possam ocorrer.

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