(Publicada no Diário de Notícias em 9 de Dezembro de 2004)
Impressionou-me a notícia referente à comparticipação nos medicamentos vir a ser inversamente proporcional ao rendimento do beneficiário. Poderia ser uma decisão governamental correcta, tendente à justiça social, mas mais parece uma utopia numa colectividade virtual em que os políticos vivem nas nuvens e legislam possivelmente com as melhores intenções, mas com um confrangedor irrealismo. No caso concreto seria óptimo que os políticos conhecessem o «país profundo», o «país real», o «interior remoto», os bairros degradados, onde apenas descem em vésperas de eleições, isto é, que andassem com os pés no chão.
O grande problema, numa análise rápida e superficial, e o principal motivo de críticas é a referência utilizada para aquilatar do rendimento do beneficiário da comparticipação medicamentosa. Será que se pretende tomar por referência o rendimento colectável para efeito de IRS? Não me custa a crer que assim seja! E, então, teremos a família de muitos estudantes que vão para as aulas em carros de topo de gama, a beneficiarem da comparticipação máxima ou mesmo de medicamentos à borla, enquanto muitos daqueles que vão a pé ou nos transportes públicos, não beneficiarão de qualquer comparticipação.
Para compreendermos isto basta recordar que alguns endinheirados, senhores do «jet set», ligados ao futebol e a empresas de grande êxito, declararam a órgãos da comunicação social que não pagam IRS por ganharem apenas o salário mínimo nacional. Juntam-se a eles muitos outros empresários e profissionais liberais que não declaram tudo quanto ganham, mas que não se inibem de ostentar, com toda a pompa e publicidade, as suas fortunas, com visíveis sinais exteriores de riqueza, da mais variada natureza.
No extremo oposto, estão os trabalhadores por conta de outrem em que se incluem os funcionários públicos a quem é retido na fonte mais do que têm de pagar, como provam as posteriores devoluções. Estes, perante as taxas moderadoras e o novo regime agora anunciado da comparticipação medicamentosa, serão considerados os «milionários» do país e pagarão os mais altos preços. Será isto justo?
A concretização da notícia atrás referida traduzir-se-á num claro e expresso apoio à fuga ao fisco o que nos faz meditar seriamente no alarme do Professor Cavaco Silva «contra políticos incompetentes que obedecem a interesses particulares». Um apelo: senhores governantes desçam à terra e, antes de fixarem tais critérios, acabem com a fuga aos impostos, com a corrupção e com a economia paralela, porque só depois poderão ter uma referência válida dos rendimentos de cada cidadão e de cada família. E já assim, para quando a abolição do sigilo bancário, para fins fiscais?
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