(Publicado no «Correio d manhã» de 18 de Março de 2004)
Embora não sejam inesperadas nem originais as recentes palavras do Sr. Dr. Mário Soares em relação a Paulo Portas e a Pedro Namora, elas demonstram um excesso de auto-estima e de presunção que não são necessárias e não lhe beneficiam a imagem. Julgando-se o detentor único da «credibilidade» devia estar consciente de que os dois visados pela sua crítica ácida ainda estão a tempo devido à sua idade («cresça e apareça»), de a obterem, enquanto o arrogante credível já não pode recuperar a «credibilidade» que tem vindo a perder, através das suas contradições sucessivas. O povo é quem mais ordena, como diz o poeta, e, quando abalado pelo ruído das campanhas eleitorais, pode enganar-se ao votar, mas, depois, na serenidade do seu raciocínio e das suas apreciações, sabe analisar o real valor das pessoas. O Sr. Dr. Mário Soares poderá estar realmente convencido de que tem uma «credibilidade» superior à de todos os cidadãos portugueses, mas parece não acreditar na «credibilidade» das suas ideias e daí a sua recusa em discuti-las com os seus opositores, por recear não as poder defender com argumento credíveis.
Uma observação rápida das palavras de Mário Soares, teriam levado a acreditar que era democrata, respeitador das liberdades e da cidadania de todos, do direito à indignação, defensor de não haver cidadãos de primeira e cidadãos de segunda, e de que ninguém está acima das críticas. O «credível» Soares contradiz o ex-«democrata» Soares. Porém aquele real valor e a carência de democraticidade e bom senso ficaram bem patentes na célebre cena ocorrida na estrada de Vila Franca quando gritou a um GNR, no cumprimento de missão conferida legitimamente por superior seu, «ó Sr Guarda desapareça». Esse caso foi relembrado no jornal A VOZ DE ESMORIZ de 25 de Fevereiro, pela pena de José Vasconcelos e Sá, em artigo muito bem informado, que o comparava, pelo contraste, com a atitude de Salazar para com Xavier de Brito que comandava uma pequena força da GNR. Também recordo a descompostura dada em público em Coimbra ao Comandante Distrital da PSP por não ter corrido à bastonada uns manifestantes que o aguardavam junto à ponte.
Não defendo os doutores P Portas e P Namora e nem sequer os conheço pessoalmente, e eles não necessitam da minha defesa. Mas o seu valor nada ficou diminuído com as palavras azedas com que foram mimoseados e que em nada diminuíram a força das suas atitudes alvejadas por tal colosso credível. Tal arrogância só é de esperar em ditadores, como foram Pinochet, Mobutu, Bocassa Idi Amin, Saddam Hussein, e o ainda vivo Kim-Jong Il. Não será própria de um democrata dialogante que respeite todos os cidadãos como seus iguais, deteste fascistas e elitistas que se considerem acima do comum dos mortais que considere carentes de credibilidade.
Enfim, se ainda pensávamos que era um democrata, caímos das nuvens ao depararmos com um autocrata, elitista, presunçoso, com laivos de ditador e de fascista. E o pior é que já não tem idade para «crescer e aparecer» nem para recuperar dos seus maus vícios. Tenho dúvidas se algum dia foi um verdadeiro democrata ou se se limitou a ser um razoável táctico na luta política. Mas de baixa política, como ficou bem evidenciado nas suas declarações quando foi preterido por uma senhora na corrida à presidência ao Parlamento Europeu. Nesse momento, a UE, sem o dizer, mostrou-lhe que devia «crescer e aparecer», coisa que talvez não tenha compreendido.
E se considera os dois doutores citados sem credibilidade, certamente eu não terei tanta como eles. Mas não lhe reconheço autoridade para me restringir o direito constitucional de ter e de exprimir opinião sobre um caso tão preocupante.
Democracia dá trabalho
Há 6 horas
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