(Publicada no Diário de Notícias em 14 de Março de 2005)
A reforma da Administração Pública é urgente e necessária, mas vai ser muito difícil e uma tarefa hercúlea para o Dr. António Costa. Relacionado com este assunto, é de realçar o significado do título da primeira página de um diário do dia nove - «Portugal sem política específica de combate à corrupção». Com efeito, a corrupção e a burocracia são dois fenómenos interrelacionados que derivam da forma como funciona a Administração Pública. Combater a corrupção não é penas, nem principalmente, um assunto de tribunais, porque nem o corrupto activo nem o passivo estão interessados em denunciar um acto sigiloso praticado entre eles, com interesse para ambos com a finalidade de ultrapassar uma dificuldade burocrática e tornar mais rápida a resolução de um processo.
Compreende-se, assim, que a burocracia gera a corrupção ou, pelo menos, alimenta as tentações que a ela conduzem. Por outro lado, a burocracia auto-reproduz-se e origina a desresponsabilização dos burocratas. Assim é quando um despacho que devia basear-se em um ou dois pareceres acaba por ser exarado num papel antecedido de mais de meia dúzia de assinaturas, muitas delas, senão todas, feitas de cruz por funcionários que, esmagados com tanta papelada, nem leram processo e agiram por mera formalidade.
Impõe-se simplificar os circuitos dos papeis, reduzindo-os ao mínimo indispensável e eliminando tarefas sem verdadeira utilidade para a finalidade em vista. Tenho experiência de que metade, ou talvez um pouco mais, dos papeis que entopem os circuitos administrativos são facilmente dispensáveis. Grande parte dos trâmites de vários processos foi originada por motivos circunstanciais irrelevantes e que foi perpetuada por inércia apesar do desaparecimento do motivo, ocupando pessoal e inibindo este de dar a atenção conveniente aos assuntos realmente importantes.
Mas a análise dos circuitos e da importância de cada tarefa não pode ser levada a cabo pelos intervenientes, viciados no sistema vigente. Tem de ser efectuada por técnicos especializados (há empresas internacionais, com nome na praça) que serão objectivos e eficientes e não deixarão de se informar junto dos chefes de cada sector, aos vários níveis, quanto às finalidades pretendidas e apresentarão um relatório final devidamente explicado.
Antes ou simultaneamente com as decisões tomadas na sequência do relatório, há que pôr em prática total transparência da informação colhida, por forma a que todos os funcionários saibam o que se passa e as razões da reforma levada a cabo, para poderem aderir ao novo sistema. Certamente que, após ser efectuada a reforma preconizada, por tais analistas, uma licença, por exemplo, que só é conseguida ao fim de anos de espera, poderá passar a ser obtida ao fim de poucos meses sem necessidade de corrupção. É imperioso que durante o estudo e na preparação da decisão final, haja a convicção dos efeitos que advirão para a vida do cidadão e da economia nacional e que, se não for possível a reforma ideal, se efectuem melhoramentos visíveis.
Como tudo isto não será tarefa fácil, por ir de encontro a interesses instalados, muitos deles inconfessáveis, o Dr. António Costa irá precisar de muita determinação e persistência. Mas o país ficar-lhe-á agradecido.
Foi sem querer!
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