(Publicada no Público de 21 de Junho de 2004)
Para podermos, conscientemente, aderir, acatar, e participar nas decisões daqueles que elegemos para dirigirem os destinos do nosso país, necessitamos de conhecer, mesmo que apenas parcialmente, os critérios adoptados.
Quando, em 11 de Junho, percorria algumas ruas da baixa lisboeta, deparei com muitas bandeiras nas janelas e varandas (algumas «de pernas para o ar») a servirem de ornamento e de «apoio» ao Euro 2004 (péssimo uso para a Bandeira Nacional, símbolo da soberania) e reparei noutras colocadas em mastros de edifícios públicos, a meia haste. Percebi que se tratava de luto nacional. Pensei que se devesse ao falecimento do deputado Lino de Carvalho, mas achei que semelhante caso não originaria tal situação.
Vi depois na imprensa que se devia ao falecimento inesperado do Professor Doutor António Sousa Franco, e ainda percebi menos. Ele não estava a desempenhar qualquer cargo público de relevância para tal homenagem, e ser candidato a eurodeputado não dá direito às regalias desse cargo, e penso que mesmo um eurodeputado não usufrui de tal honra.
Seria por ter possuído «fortes convicções, ou por ser catedrático ou por ser um «homem bom»? Quanto às convicções não sei o que poderia ter pesado mais, se a participação na fundação do CDS, se o facto de ter sido líder do PPD, se ter criado a ASDI, se ter sido ministro do governo de Guterres, se ter deixado de o ser, se ter novamente regressado ao PS, para se candidatar ao PE. Enfim, muitas dúvidas. O facto de ser catedrático não tem dado direito a tais honras fúnebres. Por outro lado, ser um «homem bom» é uma apreciação subjectiva que pode ser aplicada a muita gente. Um amigo meu, cujas opiniões aprecio, disse que essa subjectividade se aplica a todos os elementos da classe política. Também pode dar-se o caso de isto se ter devido de forma afectiva, ao facto de o falecimento ter ocorrido de forma inesperada e dramática, mas isso não é justificação pois todos os dias morrem portugueses de forma inesperada e dramática em acidentes de trabalho e rodoviários.
A minha dúvida, ou ignorância, continua por mitigar. Não sei em que situação voltará a haver luto nacional. Mas acho que, quando falecer algum dos comendadores criados no passado dez de Junho ou em datas anteriores, deverá ser bem ponderado se deve ser considerado «bom homem» para ser decretado luto nacional.
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