(Publicada no «Público» em 16 de Janeiro de 2004)
Há um velho adágio que diz que o segredo é a alma do negócio. Mas ele é também importante em muitos sectores da vida dos povos. Há o segredo profissional, bancário, de justiça, de estado, militar, etc. E em todos estes sectores há os claviculários do segredo, indivíduos credenciados, após juramento, para manusearem informação, documentos e objectos protegidos pelo segredo. Os militares têm normas rígidas para tratar as matérias com classificação, não apenas no seu arquivo, como o seu registo e a sua destruição quando desnecessárias. Qualquer rascunho ou esboço é destruído (antigamente por incineração, hoje no «franjinhas»)
Quando ouço falar nas quebras de segredo, recordo a história do assessor do rei X da Prússia, abordado pelo conde de Y que lhe fez uma pergunta indiscreta. Respondeu-lhe que não lhe podia dizer porque era segredo. O conde retrucou: «eu sei guardar segredo», ao que o assessor respondeu: «eu também sei».
O assessor estava certo. Se o indivíduo credenciado para lidar com informação classificada, prevarica fazendo uma confidência a um amigo, não pode esperar que este, que nem é credenciado, não transmita esses dados a outras pessoas. O responsável pela guarda do segredo não pode violá-lo, não pode permitir a fuga. As normas de segurança que o norteiam não permitem dúvidas ou hesitações, são inflexíveis e exigem rigor.
E não se venha agora apontar as flechas contra os jornalistas. Não se pode açoitar o miúdo da história que gritou «o rei vai nu». Quem age mal é quem lhes faculta o conhecimento de documentos e dados confidenciais. A nossa democracia, embora ainda pouco perfeita, deve muito aos Órgãos da Comunicação Social (CS) pois tem sido estes que despoletaram situações irregulares que originaram os principais processos judiciais dos últimos anos, e que têm conseguido a resolução de problemas graves que apoquentam as populações, os quais sem a sua intervenção continuariam por accionar. Falhas de serviços públicos, de autarquias ou de grandes empresas têm sido objecto de notícias na CS, e posterior resolução.
Procure-se aqueles que, tendo a seu cargo a guarda das matérias classificadas, não foram suficientemente zelosos, e não se acuse repentinamente a CS, não se lhe coloque uma mordaça. Todos (e cada um) estamos sujeitos a críticas. Em Marrocos, apesar do seu regime autoritário, o Rei acaba de amnistiar o jornalista Ali Lmrabet, activo crítico do regime. Sem críticas, sem o papel esclarecedor e informativo da CS a democracia estiola e pode dar lugar a autocracias ou ditaduras, com prejuízo para os direitos dos cidadãos que estão mais distantes das regalias do Poder. Há que evitar a ressurreição do «Portugal Amordaçado».
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