quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Contemporizar com má condução. 021226

(Publicada no «Diário de Notícias», 26 de Dezembro de 2002)

É costume dizer-se que a lógica é uma batata, mas parece que, para os responsáveis do nosso país, ela é menos do que isso. É inexistente. Ora vejamos. A lei prevê que, mesmo que não tenha havido acidente, é retirada a carta de condução a condutores que excedam os limites permitidos quer em velocidade quer em taxa de alcoolemia.

Seria lógico que essa medida fosse destinada a garantir segurança aos utentes da estrada, para o que devia ser concretizada imediatamente, não podendo o infractor continuar a conduzir nem mais um metro.

Mas não é assim. Trata-se apenas de uma medida repressiva, uma punição, uma retaliação que só será efectivada muito tempo depois de ser detectado o perigo para a colectividade. Veja-se, por exemplo, que aconteceu com o recordista nacional da alcoolemia. Continuou a poder conduzir, constituindo sério risco para transeuntes inocentes, até ter um acidente, porque a carta só lhe seria retirada semanas após ter sido detectado com o «grão na asa».

Mas a falta de lógica ou de coerência não fica por estes casos. Também aquele doutor que matou um peão na passadeira, em Santo André, embora tivesse sido considerado culpado pelo tribunal, não ficou privado de carta. Porém, ele representa um perigo real para os inocentes peões, tanto assim que, algum tempo depois, voltou a atropelar mortalmente na mesma passadeira. E quando esta notícia foi dada na televisão, ele continuava a conduzir, com o beneplácito do tribunal.

São casos reais. Não são anedotas. A legislação, os procedimentos judiciais, a actuação dos agentes (certamente cobertos pela lei) não se destinam logicamente a garantir segurança no trânsito, mas sim a «vingarem-se», isto é, a punir o infractor, dentro dos prazos legais (!) mas não actuando de imediato como seria exigido para garantir a segurança de todos nós. É incrível que um condutor exageradamente etilizado seja autorizado a continuar a viagem.

Se dos condutores se espera que quando quiserem pôr em risco a sua própria vida o façam sem colocar em perigo terceiros, dos responsáveis pela legislação e pela Justiça espera-se mais lógica e coerência a fim de que seja garantida uma efectiva segurança de todos os utentes da estrada, o que não acontece quando se permite que aqueles que são puníveis com apreensão da carta continuem a pôr em perigo as vidas dos bem-comportados.

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