quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Aprender as lições do EURO-2004. 040710

(Publicada no «Expresso» de 10 de Julho de 2004)

É sabido que não sou um adepto incondicional do futebol profissional. Não gostei de saber dos elevados custos dos estádios, dos ordenados e prémios dos jogadores, das bandeiras dos sete pagodes (versão chinesa dos castelos), do hino nacional das «Brunas», etc.

Mas o fechar das contas foi muito positivo e vale a pena aprender as lições. Portugal, em competição com os outros países da Europa, ficou em segundo lugar. Isso é um caso raro do nosso país. A selecção está, por isso, de parabéns. Pelo contrário, em tudo aquilo que traduz o bem-estar, a segurança e o poder de compra das populações costumamos ficar em último ou perto do fim.

Viveram-se momentos notáveis de unidade em torno de um objectivo único e comum. A coesão nacional e a auto-estima receberam um forte estímulo positivo. As pessoas ficaram a conhecer melhor a bandeira e o hino nacional. Num país em que não há grandes objectivos verdadeiramente assumidos, em que tudo é resolvido com xutos e caneladas, a organização do Euro constitui um exemplo a seguir, a convergência conseguida merece ser repetida na prossecução de finalidades mais significativas para a vida dos cidadãos, para garantir a vida às gerações futuras. Para isso, é imperioso que, já, agora, o Governo e a oposição se entendam e definam, de forma clara e incontroversa, objectivos nacionais de longo prazo, tracem as estratégias mais adequadas para os atingir e a concretizem, permanentemente, com a máxima determinação e coerência. Dessa forma, conseguirão mobilizar as populações com entusiasmo semelhante ao que foi bem evidenciado no apoio à selecção nacional nas últimas semanas. É indispensável a estruturação do ensino e da formação profissional com vista à modernização da economia, à produtividade e à flexibilidade do emprego, a fim de aumentar as exportações, o PIB per capita e, daí, o bem estar das populações.

Há que criar estímulos como, por exemplo, premiar a empresa com maior valor de exportações, tornar público o nome da empresa que paga mais impostos, daquela que mais investe na melhoria das condições de trabalho do seu pessoal, ou que maior apoio dá às actividades culturais. Também deve ser dado estímulo público aos estudantes que, sem nunca reprovarem, terminam os cursos com maiores classificações. O mesmo deve ser feito quanto aos municípios mais defensores do ambiente contra qualquer tipo de poluição. Etc. etc.

O entusiasmo recente não deve deixar-se morrer, mas sim ser canalizado para os grandes temas nacionais, sem o que não é tão produtivo como pode e deve ser. Devemos colocar como objectivo final, sermos também os segundos em segurança rodoviária, em segurança no trabalho, no combate ao desemprego, à fome e à falta de habitação, no conhecimento da própria língua e da matemática, etc.

Seria óptimo que Portugal ocupasse os primeiros lugares não apenas no futebol e no atletismo de deficientes, mas também nos principais sectores da economia e do desenvolvimento que se traduzem na qualidade de vida da população. Ficou evidente que o povo é fácil de mobilizar para uma causa que lhe seja apresentada como importante. Aprenda-se com a experiência do EURO e organizem-se campanhas, bem estruturadas, para os principais problemas, acabando-se, por exemplo, com tempos de antena demorados e vagos em que se fala dos fogos florestais sem se dizer às pessoas mais próximas dos locais de perigo quais as atitudes que devem tomar para os evitar, para os detectar antes de atingirem grandes proporções e para os ajudar a combater. «Juntos pela floresta, todos contra o fogo» diz tudo, mas na realidade concreta nada diz, porque nada ensina de concreto. Sejamos práticos e didácticos por forma a chegarmos às mentes e aos corações dos camponeses que lidam de perto com esse terrível flagelo. Ninguém nasce ensinado; é preciso dar informação às pessoas e, perante bons esclarecimentos, elas agirão da melhor forma, com entusiasmo. Acreditemos nos portugueses. Bem conduzidos, não serão inferiores a ninguém.

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