quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Aparência de riqueza. 040826

(Publicada em A Capital em 26 de Agosto de 2004)

Pensei estar enganado. Mas não. Era verdade. Aquele homem em mangas de camisa, em boa forma física e satisfeito, ao lado da Rosa Mota, na abertura dos jogos olímpicos de Atenas, era mesmo o Presidente de todos os portugueses. Levou bem longe o nome de Portugal, tão longe como daqui à Grécia. Os portugueses ficaram com os corações rejubilados ao verem ali o seu mais alto magistrado.

Com a alegria de o verem, os desempregados esqueceram que não têm trabalho; os funcionários públicos esqueceram que há dois anos que não são aumentados e têm perdido poder de compra para fazer face à subida do custo de vida; os «sem abrigo» esqueceram que continuam a viver na rua sem ar condicionado; os taxistas esqueceram que os seus lucros vão ser reduzidos devido ao aumento dos combustíveis; as vítimas dos fogos florestais esqueceram que todos os haveres desapareceram em cinzas e terão de recomeçar da estaca zero, e que as ajudas que lhes foram prometidas há um ano ainda não chegaram; os polícias esqueceram que não lhes foram pagos os serviços extraordinários durante o Euro 2004, etc.

Perante a imagem do PR em Atenas que ali chegou a bordo do navio Sagres (será maior do que o iate do Abramovitch, ou apenas terá mais tripulantes?) os portugueses atrás referidos e muitos outros esqueceram (ou não terão esquecido?) as dificuldades e as carências com que se debatem neste país, com um dos PIBs mais baixos da Europa, e onde se tem que viver a apertar o cinto.

Mas a verdade é que o sacrifício da grande maioria é compensado pelas despesas da classe política. Ainda há dias se lia nos jornais que o Orçamento da Assembleia da República aumentou de uma quantidade de milhões tal que a minha memória se recusou a fixar. Também, se assim não fosse, como é que se conseguiriam voluntários para se candidatarem às eleições? Mas... será melhor não esquecer; será preferível pensar calmamente sobre os valores éticos, sobre as molas que fazem mover a comunidade nacional e os seus representantes. Vive-se da aparência da riqueza. Dizia há tempos uma figura pública na primeira página de um jornal diário que lá fora consideram-nos tesos e parolos. Talvez, ao dizerem isso, estejam a ser benevolentes, a usar eufemismos.

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