sexta-feira, 14 de agosto de 2009

Saber o que se passa no Mundo. 050303

(Publicada em «A Capital» em 3 de Março de 2005)

A rápida evolução das comunicações por satélite, nos últimos anos, transformando o Mundo numa aldeia global, ligando-se tão facilmente aos antípodas como ao outro lado da rua, torna a vida actual difícil por exigir a mudança de quase todos os procedimentos e rotinas dos diversos sectores da sociedade, o que depara com inércias próprias do ser humano. Esta situação agrava-se com o facto de as transformações tecnológicas se sucederem a um ritmo cada vez mais alucinante e serem interactivas.

Hoje assiste-se aos diversos acontecimentos nos locais mais remotos dos antípodas ou de cada continente como se ocorressem em frente da nossa janela. São até mais nítidos porque são observados de vários ângulos, com várias objectivas, enquanto que os observados da janela são vistos de um ponto de vista único e restrito. E precisamos de os conhecer porque tudo tem influência em todo o lado.

Conclui-se assim da utilidade da Comunicação Social e da sua grande ferramenta, a Internet. Para se saber o que acontece em qualquer ponto da aldeia global é necessário ler, ouvir e ver, jornais, rádio e televisão. Isto é verdade mas não é suficiente, porque estes órgãos são condicionados e limitados no exercício da sua actividade, acabando por não lhes ser conveniente fornecer uma informação completa e isenta, com prioridade correspondente ao interesse do «consumidor» mais exigente. A «lei» da concorrência, leva-as à conquista de audiências, às grandes tiragens, à atracção da publicidade, etc. Isto conduz à exploração excessiva dos factos mais gritantes no momento, deixando no esquecimento acontecimentos não menos importantes e que dias antes preenchiam muito espaço, mas que passaram para segundo lugar. Eram os atentados em Israel, as emboscadas no Iraque, as revoltas na Costa do Marfim, etc. Hoje nada nos é dito das guerras étnicas na Nigéria, na República Centro Africana, na Serra Leoa, na Libéria. Pouco se diz do Sudão, com a guerrilha do coronel Garang no Sul e com Darfur no Oeste; pouco se sabe da fome na Etiópia, da grave instabilidade no Leste da República Democrática do Congo. Nada aparece sobre o ditador Robert Mugabe, etc. etc.

Há áreas do Mundo, principalmente no continente africano de que apenas chegam notícias quando o número de mortos diários passa da centena. Mas, perante um tal agravamento, as notícias chegam logo em pormenor e em quantidade até à saturação, desprezando outras que não dão tanta «venda».

Poderá, assim, concluir-se que para estarmos esclarecidos sobre o que se passa realmente no mundo, não podemos deixar de estar atentos às notícias da Comunicação Social, mas isso não basta. Temos de ir mais longe, puxar pelo cérebro, relacionar as notícias mesmo as que ocupam menos espaço, analisar as tendências da evolução das situações, imaginar o que estará a ocorrer, de acordo com a lógica e com os antecedentes e completar e testar o «puzzle» com pequenos indícios que surjam. Hoje, mais do que nunca, temos de fazer um uso intenso da nossa capacidade de reflexão e espírito crítico e analítico, para suprir a desproporção das prioridades utilizadas pelas agências de notícias. Não podemos desperdiçar nada, temos de «acreditar» em tudo, mas devagarinho... com apurado espírito crítico.

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