quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Nova economia contra a globalização

Transcrição

Uma "nova economia" para substituir globalização suicida
JN. 31-01-2009. Por Luis Filipe Menezes

Após negociações com a Oposição, foi aprovado pelo Governo o Orçamento para 2010. Um orçamento que aponta para um crescimento económico de 0,8 %, para uma redução do défice de 1% - de 9,3 para 8,3 do PIB -, para um aumento do desemprego em 0,3 % - de 9,5 para 9,8% -, para um aumento da dívida pública em 10 pontos percentuais.

Em conclusão, esta previsão assume o pessimismo fatalista que invadiu a Europa e o país. A economia continuará estagnada, o Estado assume a impossibilidade de controlar o desequilíbrio das contas públicas, o endividamento cresce a galope e os problemas sociais agudizam-se.

Contudo, paradoxalmente e infelizmente, este orçamento é, não só realista, como o único possível face ao contexto nacional e europeu em que se enquadra! Chegou o momento de pagarmos a factura de década e meia de erros e omissões.

Realista, porque, face ao imobilismo reformista, em Portugal e na Europa, não é possível atacar o principal factor de preocupação da conjuntura económica - o défice orçamental.

O défice podia ser controlado através de um pujante crescimento económico ou da actuação em relação aos três parâmetros que absorvem quase 100% da despesa do Estado: despesas sociais, despesas de funcionamento da Administração - nomeadamente os salários da Administração Pública - e o investimento. Ora, face à crise vigente, é impensável diminuir as verbas afectas à Segurança Social, Educação ou Saúde, é irrealista esmagar ainda mais o poder de compra dos funcionários públicos, é impensável reduzir abruptamente o investimento público - tal conduziria à paralisia de uma economia excessivamente dependente desse fôlego e impediria o aproveitamento do último pacote substantivo de fundos comunitários.

Neste contexto, será impossível, por este caminho, cortar nos próximos três anos mais de cinco pontos percentuais ao défice, compromisso assumido com a União Europeia. Tal só seria viável se os portugueses fossem totalmente colocados em prisão preventiva, num campo de concentração, num regime de pão e água.

É verdade que o equilíbrio das contas públicas podia e devia vir pela via do crescimento económico, mas esse trilho está armadilhado. Enquanto Portugal não tiver um desígnio definido e a Europa não entender que alinhou numa globalização suicida, tal não será possível.

A Europa, de uma forma insensata, viu partir a indústria, vê partir os serviços, aniquila as pescas e a agricultura, vivendo feliz por estar a contribuir para o maior crescimento médio de sempre da economia mundial - à custa do crescimento consistente e recorde de economias como as da Índia e da China. A Europa transforma-se assim num espaço de consumo, ignorando que, desta forma, vai enfrentar roturas sociais graves, com aumento catastrófico do desemprego e total incapacidade para sustentar o seu generoso Estado Social. Aliás, o crescimento global só existe à custa de economias onde o desrespeito com o ambiente, direitos humanos e direitos sociais as torna imparavelmente competitivas.

Assim sendo, em que pode apoiar-se um pensamento de esperança? Em primeiro lugar, na inevitável renegociação das regras que regem todo o regime de trocas à escala global. A livre circulação de fluxos financeiros, pessoas e, principalmente, de bens e serviços, terão de ser indexadas à igualização das regras do jogo. No cumprimento de direitos humanos, sociais e ambientais.

De seguida, com a adopção de um modelo de desenvolvimento alternativo, que faça da energia limpa e da protecção ambiental um estímulo à criação de uma "nova economia".
No caso português, no inevitável encontro de um rumo, que defina um projecto nacional inteligível. Mas sejamos sérios, tal não está para breve e dificilmente daremos grandes passos em frente enquanto a sensatez não chegar em simultâneo à escala europeia.

NOTA: Embora o autor não seja economista, apresenta um diagnóstico credível e uma terapia desejável mas, como confessa, sem viabilidade em futuro próximo e com condicionamentos difíceis de ultrapassar. Não há motivos para optimismos com um mínimo de sustentação.
Dados complementares podem ser vistos nos artigos do mesmo jornal Continuar à espera e O Bom Aluno

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