domingo, 28 de fevereiro de 2010

Voz do povo é voz de Deus

E a voz do povo é, muitas vezes, expressa pela pena de cronistas, bem intencionados que procuram alertar para o perigo de uma rota errada levar o navio a encalhar no rochedo e chegam ao ponto de sugerir pistas para solucionar falhas por omissão ou distracção.
Há lendas e factos antigos que hoje se tornam realidade. Transcreve-se aqui uma lição extraída do naufrágio do Titanic, e uma lenda celta, do mesmo cronista e um alerta de outro autor que merece também ser tido em atenção É pena que os governantes, obcecados como estão com a sua ambição pessoal, a concentração no seu umbigo e a teimosia orgulhosa de não quererem emendar erros e corrigir o rumo, não queiram compreender as realidades e aceitar sinais de bom senso e de ajuda.
Pessoas como o comentador anónimo que assinou António Lopes, parecendo um clone do que assinou Leandro e Bernardo, devem analisar o significado destas e de oputras crónicas, tirar as suas conclusões quanto ao presente e aconselhar as pessoas com quem contactem. Mas parece estarem mais interessados em incensar o chefe, mesmo que, com isso, o arrastem mais rapidamente para o afundamento.

Notícias do naufrágio
Jornal de Notícias. 2010-02-08. Manuel António Pina

Diz-se que, enquanto o Titanic se afundava, no salão de festas a orquestra continuou a tocar. A ter sido assim, deve ter havido um momento em que, ou porque a água chegou aos instrumentos ou porque chegou o pânico aos instrumentistas, a orquestra desafinou.
Ouve-se o primeiro-ministro dizer que o défice foi, afinal, uma opção do Governo, espécie de derrapagem controlada para tentar sair em velocidade da curva e, ao mesmo tempo, o ministro das Finanças confessar que se enganou quanto ao tamanho do "iceberg", e a desafinação dos solistas da crise orçamental não parece bom prenúncio. Acrescente-se a visão do governador do Banco de Portugal metido num bote a caminho de uma organização internacional e ceceando a monótona mantra do "Aumentem-se os impostos, baixem-se os salários" enquanto se multiplicam os rombos na credibilidade das instituições, e justificar-se-ia que crescesse a inquietação. Mas o Sporting perde, o Benfica empata, o seleccionador nacional esmurra não sei quem e Mimi Travessuras vem cantar a Lisboa. E, como que por milagre, dissipam-se, a julgar pelos jornais, todos os perigos.

Uma lenda celta
Jornal de Notícias. 100218. Manuel António Pina

Uma lenda celta, compilada por Bioy Casares em "Contos breves e extraordinários", conta a história de dois reis inimigos que jogam xadrez enquanto os seus exércitos combatem, demorando-se, como Borges diz, "hasta el alba en su severo/ ámbito en que se odian dos colores".

"Chegam mensageiros com notícias da batalha; os reis não os ouvem e, inclinados sobre o tabuleiro de prata, movem as peças de ouro... Ao entardecer, um dos reis derruba o tabuleiro porque apanhou xeque-mate e, pouco depois, um cavaleiro ensanguentado vem anunciar-lhe: 'O teu exército está em fuga, perdeste o reino'". Manuel Alegre não será propriamente um rei, nem sequer ainda um presidente, mas o silêncio em que parece mergulhado enquanto, à sua volta, o país arde em torno do tema da liberdade, recorda a longínqua lenda. É natural que esteja preocupado com os "tenue(s) rey(s), sesgo(s) alfil(es), encarnizada(s) / reina(s), torre(s) directa(s) e peon(es) ladino(s)" que se alinham no tabuleiro da sua candidatura. Mas jogar o seu jogo alheando-se do país talvez seja prudência (ou, se calhar, imprudência) comprometedora de mais.

Depois de Sócrates
Correio da Manhã. 18 Fevereiro 2010. Por Carlos de Abreu Amorim, jurista

Face ao imparável declive ético e político de Sócrates, o PS atém-se a uma atitude de resguardo aperreado do poder pelo poder – o que condicionará o futuro do partido por muitos anos. Se o PS mudasse higienicamente de líder ficaria em condições de enfrentar os desafios da governação de cabeça limpa e discurso tranquilo.

Ao contrário, parece ter optado por se barricar no bunker que a falta de vergonha do seu Chefe tramou para si e para os que não têm pudor em serem comparados com ele. Um Governo assim não governa coisa nenhuma, apenas gere de forma desconexa a sua morte adiada. O PS pagará bem caro este apoio deplorável. Em vez de ser o partido da liberdade e da democracia passará a representar o pior do regime – a malta de Sócrates, de Vara e do Soares da PT.

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