No dia 23, ao cair da tarde, a TV, ao iniciar as apreciações sobre o acto eleitoral, referiu múltiplos incidentes com o cartão de cidadão em relação ao número de eleitor. Pessoas queixavam-se de ter esperado três a quatro horas para lhes darem o número de eleitor actual e poderem votar. Outras não estiveram para esperar o esvaziamento da fila que estava à sua frente e foram para casa aumentar o número das abstenções.
Parecia evidente que a criação do cartão foi mais uma das muitas decisões governamentais tomadas sem uma cautelosa análise prévia de todos os aspectos em que o documento identificativo iria incidir. Apesar dos inúmeros assessores, escolhidos a dedo por critérios de «amiguismo», apesar dos custosos contratos de consultoria com gabinetes seleccionados por critério semelhante, as soluções continuam deploráveis, aumentando sem resultados positivos os custos que todo o sistema dos serviços de Estado acarreta.
Curiosa porém a notícia Conselho de Ministros rejeita responsabilidades nas dificuldades em votar, embora a Agência para a Modernização Administrativa que pertence à Presidência do Conselho de Ministros – explica que o cartão de cidadão “agrega e substitui os actuais cartões de contribuinte, de utente do serviço nacional de saúde, de beneficiário da segurança social e de eleitor”. O título da notícia é impensável por atribuir ao Governo o ferrete de irresponsabilidade. Isto faz lembrar que, há mais de meio século, ouço que na organização militar, onde predomina o rigor, a dedicação, a honra e a hierarquia disciplinada, «o comandante da unidade é o responsável por tudo o que esta faz ou deixa de fazer». Ora o Governo, apesar de eventualmente poder conter irresponsáveis, deve ser considerado responsável pelo que se passa na máquina estatal. Não fica bem que dê a imagem de uma equipa sem líder responsável.
Mas curiosamente, depois desta informação sobre a globalidade da equipa, aparece a notícia de que o Ministro pede desculpa por incidentes nas votações das presidenciais, o que pode levar a crer que a notícia anterior não era verdadeira, ou o MAI não se sente bem integrado na equipa e é o único a ter consciência do seu dever de governante. Num caso ou no outro, a equipa está mal treinada, nem todos jogam pelo mesmo diapasão, pelo mesmo objectivo, em sincronismo. Fazem falta em muitos sectores do Estado líderes como o Scolari que, além de bem dirigir a equipa, colocou todo o País a usar a bandeira nacional como símbolo de união e convergência para um objectivo de exaltação do orgulho pátrio. Como pode haver confiança em tal equipa governativa? Como pode haver esperança num futuro melhor do que a actual baralhada?
A angústia que foi gerada há alguns anos e tem sido persistentemente alimentada está a tornar-se patológica e dificilmente suportável. É altura de Cavaco Silva ganhar coragem e ultrapassar a sua tímida hesitação e a tendência para tabus. Portugal precisa que tome atitudes patrióticas. Se o PR não conseguir este efeito, resta o incómodo de soluções populares, a explosão social espontânea, como o que tem acontecido pela Tunísia, a Albânia, a Bélgica, o Egipto. Oxalá se consiga uma evolução pacífica, mas eficaz, sem os danos de tais manifestações descoordenadas.
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DELITO há dez anos
Há 2 horas
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