(Public em DIABO nº 2339 de 29-10-2021-29, pág 16, por António João Soares)
Li, há dias que, apesar de ter havido muitas promessas de ser limitado ou mesmo eliminado o abuso da corrupção e do enriquecimento ilícito não têm sido vistos os resultados desejados por tais boas intenções. E a própria Justiça parece demasiado complacente com esses actos imorais e lesivos do respeito que deve existir pelos cidadãos mais afastados do poder financeiro. O dinheiro que é depositado num paraíso fiscal saiu, directa ou indirectamente, do bolso dos cidadãos mais desprezados pelo Poder e, por isso, contribui para agravar a injustiça social.
Houve almas bem formadas mas ingénuas que defenderam que o Governo devia
tomar medidas rigorosas contra os indivíduos detectados em tais actividades
ilegítimas. Mas logo apareceram pessoas esclarecidas a afirmar que os
governantes não possuem a devida capacidade para lutar contra os donos do
dinheiro que são todo-poderosos e têm artes de travar tais iniciativas da parte
do governo. Por vezes, não dão liberdade aos políticos para meterem na ordem
esses poderosos porque inclusivamente, de uma maneira ou de outra, já os
comprometeram num aspecto ou outro de forma que perderam perante eles a
liberdade de actuar. Há países em que ex-governantes já foram condenados por
tais crimes, mas só depois de saírem do âmbito em que estavam sob controlo dos
«donos» e deixarem de ter interesse para as manigâncias do poder legal.
Tal estratégia de poder pode ser visualizada na área dos actos de
terrorismo. Também as pessoas bem intencionadas defendem que o terrorismo deve
ser abolido, mas logo dados a demonstrar que esse terrorismo é financiado por
grandes poderes que se sobrepõem a chefes de governo e até têm interesses em
fábricas de armamento e outro material de violência ajustada a tal actividade
que torna ineficaz forças militares e se lhes sobrepõe, por pressão da parte
dos «donos». Repare-se que os militares americanos, a maior potência
estratégica, já saíram de forma pouco garbosa, do Vietname, da Somália, do
Iraque e agora do Afeganistão. Outros valores mais altos se levantaram.
E perante tais pressões, há estados que misturam conforme as áreas em jogo,
os valores em vista, como recentemente o Quénia que pediu à Etiópia a
cessação das hostilidades com o Tigray a fim de facilitar a entrega de ajuda
humanitária à população desta área que está com grave carência alimentar. Mas,
simultaneamente, recusa a decisão do Tribunal Internacional de Justiça sobre o
litígio da fronteira marítima com a Somália por a considerar favorável a este
país do Corno de África.
Por seu lado, a Somália deseja que o seu vizinho respeite a supremacia do direito internacional e dos tratados e aceite a
decisão do tribunal e procure não intervir nos assuntos internos do vizinho.
Parece que o Quénia não está a aproveitar esta oportunidade de reforçar as
relações entre os dois estados e povos, com melhor tom conciliatório e
procurando uma coexistência pacífica e cooperação de vizinhança à semelhança
daquilo que parece pretender com a Etiópia.
As realidades factuais acabam por mostrar a prioridade dada aos interesses
materiais sobrepondo-os aos valores da harmonia humanitária e da paz. Há
interesses de exploração de petróleo e gás e, perante estes interesses, um
centímetro de território pode levar a extremos de agressividade.
Teoricamente, a eliminação de muitos factos indesejáveis parece
relativamente fácil, mas a ambiência a que se subordinam os políticos no meio
de tanta complexidade, torna-lhes difícil a decisão, não vá ela prejudicar a
quantidade de votos nas eleições seguintes ou a melhoria que desejam na sua vivência,
pois não lhes é fácil conciliar todos os interesses. A escolha exige, muitas
vezes, grande coragem e capacidade de correr riscos e nem todos os riscos se
coadunam com as ambições pessoais que muitas vezes se sobrepõem aos interesses
nacionais.
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