(Public em DIABO nº 2325 de 23-07-2021, pág 16. Por António João Soares)
As obras no antigo Hospital Militar de doenças infecto-contagiosas estão sob suspeita. O artigo de jornal onde vi a notícia começava com a frase “Requalificação derrapou 2,7 milhões e envolveu salão de estética”. “Quanto mais queremos colocar algo secreto, mais à vista de todos fica”, declarou deputado Carlos Eduardo Reis, do PSD.
Mais adiante lia-se que a requalificação estava orçada em 700 mil euros e o seu custo final foi de 3,4 milhões, quase o quíntuplo. Há que explicar quem foram os técnicos que elaboraram o orçamento inicial e as condições do concurso público. E há que investigar a forma como foram feitos os posteriores contratos e com quem foram assinados. O ministério da Defesa (MDN) confirma que o relatório elabo-rado sobre a execução dos contratos foí classificado de confidencial.
Há poucos dias, veio algo escrito nos jornais que explicava uma forma segura de praticar corrupção praticando contratos directos em vez de concurso público. Este é apresentado de forma a não ser aceite por nenhum dos possíveis interessados e, depois, por não ter havido concorrentes, fica a via aberta para legalmente se proceder a contratos directos com amigos já abordados. Pergunto se a investigação sobre o caso referido do antigo Hospital irá detectar manobra semelhante e que sanções resultarão para os implicados.
Mas, tem havido mais casos focados publicamente a porem em dúvida a seriedade de pessoas no desempenho de funções de responsabilidade como, por exemplo, o atropelamento mortal de um trabalhador na estrada, por um carro suspeito de ir a mais do dobro da velocidade máxima permitida. O ministro que seguia na viatura afirmou que as obras não estavam sinalizadas de forma bem visível, facto que a entidade responsável pelas obras negou com toda a certeza e segurança. E o diálogo parou, mas o trabalhador perdeu a vida e foi considerado culpado pelo ministro. Também foi noticiado que a viatura não estava devidamente legalizada.
Outro caso nada claro foi o do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa ter negado qualquer responsabilidade sobre a denúncia de cidadãos russos ao seu governo, implicados numa manifestação contra o seu regime nacional, tendo entregue na embaixada russa os dados pessoais dos oposicionistas. E consta que as culpas foram atribuídas ao encarregado da protecção de dados da autarquia. Mas tal decisão foi suspensa perante a opinião do Plenário da Câmara, em que foi decidida uma auditoria externa a tal escândalo. Isto faz-me recordar uma tradição militar que diz que “o comandante é responsável por tudo o que a sua unidade faz ou deixa de fazer”. Por isso, nas pirâmides hierárquicas da unidade, os seus responsáveis estão muito atentos a toda a sua actividade, para evitar que “quem se lixa é o plantão”.
Segundo a Juíza Desembargadora Florbela Sebastião e Silva, a Constituição da República Portuguesa não contém nada que permita que os direitos humanos nela referidos sejam limitados, a não ser em Estado de Emergência ou em Estado de Sítio. Por motivos de especial gravidade, que têm de ser justificados e por períodos muito limitados, podem praticar-se condicionamentos às liberdades de movimentos, devidamente acompanhados de conselhos e informações que levem as pessoas a concordarem com a limitação dos seus direitos constitucionais.
A preocupação de limitar a difusão de doenças contagiosas pode aconselhar tais medidas restritivas, mas estas não devem ser impostas contra a vontade de cada um “A todos os cidadãos é garantido o direito de se deslocarem e fixarem livremente em qualquer parte do território nacional”. Não se deve abusar do confinamento. Portanto, a acção das Forças de Segurança de dispersar pessoas em festas familiares com algumas dezenas de participantes não deve revestir o aspecto de lidar com criminosos, mas sim de informar do perigo de eventual contágio e da conveniência de se afastarem e dispersarem. Enfim, mais como acção paternal do que como acção policial. ■
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